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quinta-feira, 4 de abril de 2013

A roda-viva doentia do consumo e a felicidade - Cora Rónai

"O que a publicidade nos apresenta como passaporte para a felicidade é, no seu avesso, o caminho para uma desilusão e uma frustração tão grandes que, um dia, podem explodir sem mais nem menos na rua."

No sábado, o jornal publicou uma ótima entrevista com Zygmunt Bauman, feita pelo Fernando Duarte, em Londres. Aos 85 anos, Bauman é considerado um dos sociólogos mais importantes do planeta. O que ele disse confirmou o que eu havia intuído: o quebra-quebra inglês foi o motim dos consumidores excluídos.

Não tenho a menor idéia de como podemos sair da roda-viva doentia do consumo, sobre a qual construímos a nossa economia, e da qual todos somos vítimas, em maior ou menor grau; mas é fundamental que algo se faça nesse sentido, ou estaremos condenados à infelicidade perpétua.

Bauman diz que, além disso, precisamos repensar a maneira como medimos o bem-estar:

"A busca da felicidade não deve ser atrelada a indicadores de riqueza, pois isso apenas resulta numa erosão do espírito comunitário em prol de competição e egoísmo. A prosperidade hoje em dia está sendo medida em termos de produção material, e isso só tende a criar mais problemas."

Nada mais verdadeiro. Andei pela Índia, país reconhecidamente pobre, e percebi muitos sinais de contentamento e alegria. No seu exato oposto, a Península Escandinava, que não podia ser mais rica e bem resolvida materialmente, notei muita cortesia, educação e gentileza, mas alegria é palavra que não consigo associar à região. Em nenhum dos casos, porém, me atreveria a falar em felicidade, sensação sutil e difícil de interpretar.

* * *

Tenho, aliás, pensado muito sobre a felicidade, em parte pelas circunstâncias atuais da minha vida, em parte pelo fato de ter feito anos e recebido uma quantidade de votos simpáticos dos amigos, que me desejaram o que habitualmente se deseja aos aniversariantes: felicidade, paz, saúde, prosperidade, calorias que não engordam e assim por diante. 

Lendo as mensagens, me dei conta de que uma só palavra bastaria por todas as outras: felicidade, justamente. Impossível ser feliz sem um mínimo de saúde, de paz, de prosperidade e do que mais possa ser julgado essencial à vida, e que varia, naturalmente, de pessoa a pessoa. Afinal, este vago estado de espírito pressupõe o equilíbrio de todos os outros sentimentos e condições na travessia da corda bamba que nos leva do nada ao lugar nenhum. Desejar felicidade é, pois, desejar tudo.

* * * 

Quando era criança, adorava um jogo de tabuleiro chamado Careers, em que cada jogador escrevia num papelzinho a sua receita de sucesso. Ganhava quem atingisse primeiro a sua meta. A receita consistia de uma mistura de três ingredientes: fama, dinheiro, felicidade. Uma receita típica seria, por exemplo, 50 felicidades, 10 famas e 40 dinheiros. 

Parecia tão fácil! Ainda assim, a vida não deixa de ser uma espécie de Careers ao vivo, com uma quantidade substancialmente maior de ingredientes e combinações."

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