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terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Adoráveis mulheres - Nadia foes


Aquela família era o protótipo da família ideal, um pai e uma mãe que se amavam, e dois filhos lindos, um menino e uma linda menina com quem a mãe gostava de brincar de boneca. Moravam em zona nobre. Foi em uma época que uma importante estatal se instalou na capital e para estimular os seus funcionários ofereceu várias regalias, entre estas o financiamento de casas de alto padrão como forma de compensação pela mudança de Estado e também um aumento significativo no salário. Foi com toda essa mordomia que a família se instalou na nova cidade. Foi a explosão imobiliária e demográfica e a pacata capital, com suas praias e topografia linda, logo se tornou o paraíso na terra. Como sempre tem um porem, com a chegada do alto escalão também chegaram os alpinistas sociais. Foi simples, os jovens funcionários da empresa chegaram ao topo muito rápido sem tempo para digerir todas as oportunidades, ficaram deslumbrados e passaram a ser assediados pelas mulheres disponíveis que buscavam uma forma de melhorar seu status. Para os homens ser fiel não era mais ponto de honra e logo ter casos foi se tornando algo corriqueiro. Eles até gostavam de alardear seus casos extraconjugais. Coisa bem de macho contar para o outro macho que estava tendo um caso. E foi aí que a jovem mulher ficou sabendo do caso de seu marido que negou tudo mas que logo estava caindo em tentação. E assim ainda viveram juntos por mais alguns anos, até que o casamento acabou. Tudo foi dividido, até os talheres e a samambaia, fora as colchas de crochê da mamã da cabeça do casal. Com o dinheiro da venda da casa que ainda não estava quitada, eles compraram dois pequenos apartamentos. O ex-marido foi morar com a eleita e a ex-mulher ficou com os dois filhos. Foram levando a vida meio aos trancos, com as crianças em idade escolar. Foram anos de penúria. Isso durou até a entrada do filho na universidade. O rapaz foi estudar medicina. O pai do rapaz viu aí a oportunidade de fazer uma pequena economia, e propôs ao filho ir morar com ele em troca de um carro. O rapaz concordou, a mãe foi avisada do acordo e não concordou pois a filha mais nova ainda estava cursando o colegial e as suas despesas eram muito grandes. A mãe implorou para que o filho ficasse, e se não por amor, mas por compaixão porque ela tinha um sub emprego que não dava sequer para pagar o aluguel do imóvel onde estavam morando; porque para fazer frente as despesas com a educação dos filhos, ela vendeu o pequeno apartamento que comprara na época da separação. O filho não se compadeceu e foi morar com o pai. A avó das crianças para ajudar a filha, como recebia uma pensão do falecido marido, foi morar junto. E foi este arranjo que possibilitou a entrada da neta na faculdade. A menina foi estudar bioquímica e o pai mais uma vez apareceu para propor a compra de um apartamento financiado ou carro. A moça estava morando em uma cidade próxima dividindo um sala e quarto com mais três meninas, mas não aceitou qualquer oferta. Enfrentou anos de penúria, via a mãe a avó passarem a morar em um quarto alugado em casa de uma família. Arranjou trabalho na faculdade onde estudava, era uma excelente aluna e concluiu o curso com louvor. Nunca se reconciliou com o pai ou o irmão que se formou em medicina e foi morar no interior paulista sem procurar pela mãe ou pela irmã. O jovem médico conheceu um enfermeiro durante o curso de medicina e se apaixonou. Depois de formados foram morar juntos. Ele era muito grato pelo que o companheiro fez por ele. Durante o curso quem deu suporte financeiro para que ele conseguisse estudar e mesmo depois quando foi fazer residência, foi o seu companheiro, porque o jovem foi deixado à deriva pelo pai. A bioquímica está muito bem financeiramente e recebeu uma proposta irrecusável. A moça é uma vencedora e as três mulheres continuam vivendo juntas. A avó, aconselhada pelo médico amigo da família, foi fazer um curso de canto e conheceu um maestro, senhor de setenta e três anos, que faz um trabalho social muito importante junto a jovens carentes. Houve uma empatia entre os dois e ela aos setenta anos está namorando. Não pensa em casar, ele até tentou convencer a eleita, mas segundo ela, como estão vivendo já está de bom tamanho, e que o casamento não vai fazer diferença, é só mera formalidade. A filha sofreu duas cirurgias no coração, mas já está recuperada. Foi aposentada por motivo de saúde, mas está começando um pequeno negócio. Ela está comercializando arte sacra e artesanato estilo barroco fabricado em Minas Gerais. Conheceu um delegado da polícia federal aposentado, estão namorando e ela não deseja casar, e também não deseja morar junto. Está feliz e isso é que importa. A neta é pesquisadora, faz parte da equipe de famoso cientista norte americano. Aos trinta e dois anos não pensa em casamento, mas está de namoro assumido com um cientista que vem com freqüência ao Brasil só para acompanhar sua amada. O irmão da doutora continua morando no interior de São Paulo com o seu companheiro. O pai dos dois está com saúde debilitada por conta do alcoolismo e como saiu da empresa onde trabalhava só para receber o dinheiro da demissão incentivada, hoje sem aposentadoria vive de uma pensão que sua ex-mulher lhe dá espontaneamente. Continua no mesmo apartamento apertado. Teve mais duas filhas que são vendedoras de lojas no shopping e não puderam estudar. Não se sabe se foi por falta de verba ou de estímulo, mas, seja lá o que for, a vida para ele foi bem mais difícil, caráter fraco, se enterrou no alcoolismo, e vive a margem da vida, sem o carinho e o respeito de seus familiares, recebendo ajuda financeira justamente de onde menos se esperava. Explica-se: aquelas mulheres são grandes guerreiras, elas sofreram mas não desistiram de conquistar o seu lugar ao sol.

Restaurandora de bens culturais, pintora, escultora, ourives, Em 2010 foi classificada em concurso internacional em contos e cronicas, Três livros publicados e uma coletânea do concurso Edições AG. Mora em Florianópolis, na ilha, casada, três filhos, gosta de animais domésticos, de cultivar plantas, reunir os amigos, viajar, leitura, cinema, e a paixão de escrever.

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