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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Anabel - Nadia Foes


Anabel Betina chegou ao mundo mostrando para que veio. Bebê chorão, trocou a noite pelo dia. Quando completou um ano, parecia que acabara de completar três. Vivia de nariz sujo, mordia e era agressiva. Aos trezes anos, deu o seu brado de guerra: trocou o dia pela noite. Aos dezesseis era mal vestida, deselegante, usava manequim quarenta e seis, corpo mal feito, seu rosto parecia lua cheia, cabelos cor de palha de milho maltratados, longos até a cintura, mal encarada, mal educada, mas nem tudo pode ser tão imperfeito. Os seus olhos eram verdes, de gato. Sua mãe não conseguia dominá-la e na escola era uma vergonha. Vivia entre os meninos, era cascuda, casca grossa, sem classe. Mais tarde passou a provocar todos os homens, dos dezoito aos sessenta anos. Não teve respeito nem pela amiga de sua mãe. Se insinuou tanto para o marido da outra que o jovem senhor saiu da festa e esqueceu a mulher dele lá. Passou por tantas camas, não teve amigas, pois não era companhia recomendável. Era leviana e mau exemplo, mas teve em sua mãe sua fiel alcoviteira. Com um metro e oitenta de altura, gostava de fazer o tipo bebezão, Quando falava era toleirona, débil e fazia caras e bocas. Sua fama era grandioza, as mães dos rapazes corriam com ela. Foi enxotada de várias residências. Aos dezoito não se tinha noção de quanto anjos mandou para o céu. Quando conseguia marcar uma entrevista de emprego, era só olhar a maneira como ela se apresentava para saber que não seria contratada. Não usava jeans, usava tapa-sexo. As carnes sempre a vista. O decote de suas blusas se encontrava com a barra. Nos pés, botas de solado duplo e salto, nas cores rosa bebê, branco e azulzinho. No inverno rigoroso, usava jaquetinhas mini de nylon com capuz e pluminhas, e botinhas combinando com pluminhas. O mau gosto ali fez morada. Certa ocasião não resisti e perguntei a uma amiga, o que significa isso? Minha amiga respondeu: pupé, é pilantragem mesmo. Tipo entrão, ela bebia feito gambá. Era moça de personalidade forte. Era uma toupeira e se achava brilhante. Distribuiu panfletos em sinaleiras, trabalhou no “venda fácil” e em casas de eventos mambembe. Eu olhava aquilo tudo e pensava com os meus botões: aí está o tipo de vagabundagem permitida. Tempos depois, vi Anabel Betina grávida e trouxe a tira-colo o marido(???) para apresentar às amigas de sua mãe que muito orgulhosa do feito da filha dizia: este é o futuro marido de Anabel Betina. Mas ela perdeu o bebê, foi hospitalizada, o pai do bebê não apareceu no hospital e a mãe dela fez uma vaquinha entre as amigas para pagas as despesas hospitalares. Saiu do hospital, teve depressão pós aborto, se recuperou, e um mês depois caiu na gandaia porque ninguém é de ferro. Segundo ouvi dizer, ela entrou na casa da amiga de sua mãe e foi dormir com o filho da dona da casa. Quando o rapaz acordou e viu que era ela que estava ao seu lado, atirou-se do primeiro andar e caiu dentro de um canteiro de manjericão onde ficou amoitado até sua mãe chegar em casa. Quanto ao candidato a marido de Anabel Betina, ele hoje vive com uma mulher que é vinte anos mais velha que ele, mas que ele está bem feliz e não quer saber de Anabel Betina. Dela ela só quer distância. Aos vinte anos ela perdeu o viço, o corpão está molengo, sovado mesmo, ficou com cara de boneca pornô e o que me consta a fila empacou. E agora Anabel Betina?

Restaurandora de bens culturais, pintora, escultora, ourives, Em 2010 foi classificada em concurso internacional em contos e cronicas, Três livros publicados e uma coletânea do concurso Edições AG. Mora em Florianópolis, na ilha, casada, três filhos, gosta de animais domésticos, de cultivar plantas, reunir os amigos, viajar, leitura, cinema, e a paixão de escrever.

Um comentário:

Nana disse...

Boa noite!!
Belo texto de Nádia Foes..Amei!!
Um abraço,
Ana Maria