O desembargador está caduco, olé, olé, olá! A
molecada da rua passa cantando na porta da residência do próprio! Que sai de
sua casa com chinelo na mão e vociferante tenta apanhar os moleques. Sua mulher
já está cansada dos espetáculos que aquela família anda aprontando e se
resignou na religião, não sai da igreja. Sempre foi católica e cantou no coral.
O desembargador recebeu uma educação rígida, desde menino era circunspecto. A
família achava engraçado um menino tão pequeno e tão responsável; foi um aluno
excelente, colecionava medalhas de mérito. Jovem, nunca incomodou, não teve o
ranço de todo adolescente. Diziam que ele foi adulto antes do tempo. Casou logo
no início da carreira com a primeira namorada. Teve uma vida folgada. Mal entrou
na terceira idade começou o tormento. Pensando bem ele tem razão de sobra para
perder a razão. Seus filhos seguiram seu caminho. Ele quer saber de onde veio
tanta loucura, tanta insanidade mental, pois o louco não é ele! Se bem que já
está se sentindo no limiar da loucura! Tudo começou quando o filho de seu
filho, seu neto, teve um envolvimento com uma jovem senhora casada com o filho
do senador. A mulher perdeu a cabeça e ficou loucamente apaixonada pelo neto do
desembargador. Ela era ciumenta e o rapaz tentou matar a jovem senhora e foi
preso em fragrante. Depois foi seu outro neto que formou uma gangue
unifamiliar, e em um dia calmo quando todos estavam fora, ele abriu a porta do
apartamento do vizinho do andar de baixo (o prédio tem dez andares e dez
apartamentos). Ele estava mancomunado com seus primos que entraram no
apartamento e fizeram um arrastão. Como foi fácil, na semana seguinte eles
elegeram outro andar para assaltar. Se deram mal, o vizinho preocupado e
desconfiado colocou câmara filmadora e o porteiro viu que o apartamento estava
sendo assaltado, chamou a polícia que prendeu todos os aprendizes de bandido.
Todos eram menores de idade e foram algemados no prédio. Logo após foi a filha
de seu filho caçula, moça de fino trato e finória que invadiu a residência de
seu amante onde realizou uma festa e tanto. Ela tinha a chave da casa, estava
acostumada a dormir lá algumas vezes. Os vizinhos ouviram barulho e chamaram a
polícia. Esta rolando o maior barato que virou barraco. O dono da casa chegou e
como era secretário de estado e tinha uma reputação a zelar, entrou com um
processo contra a moça que por sua vez era casada e com quatro filhos pequenos.
Suas netas gêmeas, filhas de sua única filha, meninas bonitas, finas, educadas,
foram estudar na Europa. Um amigo do desembargador foi para Barcelona e foi com
a sua mulher conhecer a noite e sua mulher reconheceu as moças que eram
dançarinas. Preocupada, a ilustre senhora foi falar com as jovens na saída da
boate. A noite estava fria, porem ela não arredou o pé até ver as duas saírem
da boate. Estava com medo da máfia, pois a máfia eram as próprias meninas que
reconhecendo a amiga de sua avó convidaram o casal para outra casa noturna em
que trabalhavam. O casal aceitou o convite e na noite seguinte estavam a
postos. As meninas faziam strip-tease na tal casa noturna que era um
inferninho. Na hora da saída o amigo do desembargador foi assaltado e sua
mulher foi espoliada de suas jóias. Levaram até a aliança de casamento. O
último neto abandonou a faculdade para ser distribuidor de drogas que eram
fabricadas na casa de praia do avô. A polícia foi avisada porque os vizinhos
estavam preocupados com o entra e saia e como conheciam o histórico familiar e
pensando que o avô era sócio dos netos, resolveram o impasse chamando a polícia
federal. Com todos esses contratempos, o desembargador quer porque quer saber
de onde veio esta maldita loucura pois do lado dele é que não foi. Ele agora
acusa os familiares de sua mulher que é filha de um ex-governador. Segundo ouvi
dizer, o casal está se separando pois a mulher do desembargador cansada de
tanta falta de vergonha na família, resolveu assumir o seu caso com o pároco
que é pai de seu filho caçula. Os fiéis estão divididos, uma ala acredita no
pároco que se diz inocente, mas a outra jura de pé junto que já viu a ilustre
senhora trocando olhares com o pároco durante a missa das dez. O pároco tem
olhos azuis e o filho caçula da ilustre dama também. O pároco é alto, o filho
caçula da ilustre dama também é alto e seus irmãos são baixinhos como o
desembargador. A senhora em questão jura que a loucura deve ser hereditária,
pois um trizavô do desembargador era maluco, comia casca da banana e jogava a
banana fora.
Restaurandora
de bens culturais, pintora, escultora, ourives, Em 2010 foi
classificada em concurso internacional em contos e cronicas, Três livros
publicados e uma coletânea do concurso Edições AG. Mora em Florianópolis, na ilha, casada, três filhos, gosta de animais
domésticos, de cultivar plantas, reunir os amigos, viajar, leitura,
cinema, e a paixão de escrever.
Um comentário:
Boa tarde!!
Ótimo conto.O desenrolar dos acontecimentos familiares se tornam atuais e até engraçados..
"Família de fino trato" - Nadia Foes, retrata a nossa sociedade com as suas hipocrisias e falsidades..Legal!!!
Um abraço,
Ana Maria
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