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sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Gostosa em Braille - Ruy Castro

Maria Sharapova, a tenista russa, está ameaçada de passar à posteridade não como uma supercampeã e atleta de grande beleza, mas como uma mulher que, no apogeu de seus 26 anos, cometeu o pecado de ter... celulite. Experimente googlar "Sharapova" e "celulite" --a tela se encherá de imagens mostrando o que se esconde (ou não se esconde) por baixo dos seus saiotinhos brancos.
Sharapova tem celulite, e daí? Algum dos fotógrafos mais interessados nos relevos supostamente imperfeitos de suas coxas do que na precisão e força de seus saques terá oportunidade de conferir ao vivo se aqueles detalhes são mesmo tão desprimorosos? Ou todos ficarão no ora veja, apenas clicando de longe e desdenhando o que não podem ter?
E desde quando os heróis, mesmo os do passado, tinham de ser perfeitos? Frank Sinatra, Humphrey Bogart, Fred Astaire, Gary Cooper, Bing Crosby, Gene Kelly, Henry Fonda e John Wayne eram carecas. Não ficaram carecas --já o eram no apogeu de seu estrelato. Foram salvos pelas perucas dos anos 40 e 50, muito mais realistas do que as que viriam depois. Sean Connery, também --o irresistível 007 de "O Satânico Dr. No", "Moscou Contra 007" e "007 Contra Goldfinger" já era um James Bond com peruca.
Os correspondentes em Hollywood sabiam que, do nariz para baixo, Raquel Welch era uma plástica só. Elizabeth Taylor tinha queixo duplo e canelas finas. Doris Day, milhões de sardas. Clark Gable usava dentadura. E Marlon Brando não tomava banho. Mas isso não era notícia. Valia o que se via na tela.
Os homens sempre deram a mesma importância à celulite do que a uma marca de vacina no corpo da mulher. Ou seja, nenhuma. Até que uma frase recente do meu amigo Leo Jaime levou a uma revisão do conceito: "Celulite significa gostosa em Braille".


Publicado por Folha de SP

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