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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Carta para a amante do meu marido - Por Nadia Foes

Tê! Não sei se li em algum lugar ou ouvi dizer que mulheres que dividem o mesmo homem são irmãs de sêmen. Pois bem, antes de sua entrada triunfal na vida de meu marido e que mais tarde tornou-se o nosso marido ele teve algumas aventuras. Recordo-me de algumas. Que ver? Por exemplo, uma tinha nome de camafeu, teve outra que tinha de nome de adeus e casou com o amigo dele. Foi esta que, na festa de quinze anos de minha filha, me disse, quem diria que já fazem quinze anos que ele me falou que estava infeliz com a sua gravidez. Lhe respondi, não sei porque afinal que ia parir era eu! Sei Tê que você que tem nome de santa deve ter vivido uma tórrida paixão, você era casada com um homem culto e bonito, tinha seus filhos e um lar, aparentemente, estruturado. Sabe que eu sempre achei o seu marido lindo? Você me roubou os melhores momentos. Quando minha filha resolveu consultar, pela primeira vez, um médico ginecologista você se encarregou de escolher e marcar a consulta. Esse momento você me roubou. Todo o início do período letivo você se encarregava de escolher e comprar todo o material escolar. Esse momento você também me roubou. Quando eu mandava minhas receitas de óculos para a ótica, você ia lá e escolhia outros modelos, mais adequados. Meus batons, que o contrabandista trazia por encomenda, você não gostava da cor nem do preço. Achava um absurdo eu comprar um batom tão caro! Você se transformou em minha sombra. Até chegar ao ponto de nosso marido implicar com tudo o que eu era. A minha alegria, a minha postura, ofuscava o caso de vocês. Lembra aquela ocasião que eu fui com ele a um festa na cidade azul? E depois resolvi esticar até as termas? Naquele tempo não existia celular e ele foi obrigado a ligar para você na minha frente para avisar que nós estávamos lá. Vocês brigaram, você não gostou da idéia e ele respondeu, a idéia não foi minha, ela que quis vir para cá, mas amanhã estaremos de volta. O amanhã era sábado e eu desejava voltar só no domingo. Mas sábado estávamos de volta. Posso te garantir que nada aconteceu nas termas, ele sempre foi fiel aos casos dele, porém você estragou o meu final de semana, porque ele ficou lá, mas parecia um bicho acuado. Parabéns, você era poderosa! Fui aposentada aos trinta e oito anos. Não sei quantos anos você contava naquela época, mas era bem menos que os meus trinta e oito, porque ele me olhava e dizia você está ficando velha. Ah Tê, eu ouvi muito isso! E ouvi muitas vezes ele dizer que você era muito elegante, você foi manequim do Pamplona e ficou furioso quando a empresa onde vocês trabalhavam baixou uma norma exigindo o uso de uniforme. Você, eleganterrima, ficou inconsolável e ele também. No principio não sei bem o que você queria, se era só sexo ou, por ser casada, poderia ser um arranjo prático para os dois. O que você não contava é que a legítima era quem brilhava nas festas, quem o acompanhava nas viagens e isso ter lhe incomodado um bocado. Não é verdade? Ser a outra não deve ser fácil. E foi nessa época que você começou a pagar a Celinha que vendia jóias e que você sabia que eu conhecia, pois na sua inteligência você pagava suas jóias com cheques do nosso marido. Deve ter sido emocionante, não é? Você me roubou os momentos mágicos com meus filhos. Você roubou a minha paz e o sofrimento de uma mulher enganada não tem o que possa explicar, é uma dor sem fim. Há muito ele não usava aliança e eu também não. Pois certo dia ele chegou com um par de alianças, muito ordinárias e colocou uma no dedo dele e uma no meu. Foi simbólico Tê, era para você. Quando viajamos para a Europa, andávamos grudados dia e noite. Ele não teve como comprar um presente para você, mas me pediu para eu fazer a compra e eu fiz. Vocês estavam tão encantados. Naquela época ele abriu todas as portas e janelas para que eu resolvesse sair. Facilitou tanto que você nem imagina. Sabe aquelas coisinhas desagradáveis, tipo negociar com gerentes de banco, trocar cheques com agiota, fui colocada na frente de batalha. Pois bem, nessa época fui apresentada, por intermédio de uma amiga, a um banqueiro. Ele me trocava todos os cheques e não me cobrava juros, em nome de uma antiga amizade com minha amiga, até que certo dia ele me convidou para conhecer um lugar. Ele me levou para conhecer uma casa que era muito maior que a minha, de uma arquitetura elegantíssima, e foi na exatamente na frente dessa casa, depois de me perguntar o que eu achava, e eu achei lindíssima, ele me convidou para conhecer a casa porque a dona da casa ainda morava lá. Ele queria que eu conhecesse as obras de arte e disse que tudo aquilo seria meu desde que eu deixasse o nosso marido. Ele queria assumir a minha vida e os meus filhos. Veja só Tê, um banqueiro. Mas eu não entrei na casa, não aceitei a oferta, disse a ela que amava o nosso marido e ganhei um inimigo. Enquanto você se divertia eu costurava a vida de meus filhos, mas deixa prá lá. Fiquei triste por você quando o nosso marido conheceu a Lolita. Veja que ironia, a nossa filha mais velha contava vinte e cinco anos e a Lolita tinha dezenove e ele perdeu a cabeça pela Lolita. E você, coitadinha, foi passada para trás. Pelos meus cálculos, já contavas mais de trinta e foi trocada da mesma forma que eu fui. Só que como mulher imagino que sua dor tenha sido bem maior. Para fazer tudo o que fez comigo, você foi vingativa e cruel, mas da última vez que te vi, pensei, coitada, ele acabou com ela. Você está uma senhora bem idosa ao passo que eu congelei no tempo, mas o que eu desejo te dizer é que, se ele não me amou, não te amou, não amou a Lolita, mas sofreu um bocado quando a Lolita saiu da vida dele. Isso eu estava lá para ver e foi muito triste. Até a saúde dele ficou debilitada. Ele perdeu uma fonte de prazer. Eu senti compaixão. Agora, amor, isso ele não sentiu por nenhuma de nós. O amor verdadeiro é coisa que ele desconhece. Trair, faz parte da natureza de pessoas que não sabem amar. O mais importante é que eu soube manter a minha integridade. O meu compromisso com a vida é saber que eu jamais traí alguém, mas para isso há de se ter uma reserva ética muito grande. Minha irmã de semem, já não te desejo tanto mal. Existe a lei do retorno. O mal que vocês me fizeram retornou e naquele momento vocês se mereceram. Ele te usou e jogou fora, a Lolita deve ter voltado para o lugar de onde jamais devia ter saído e eu não sei bem se você notou, mas eu sou a dona da história.

Restaurandora de bens culturais, pintora, escultora, ourives, Em 2010 foi classificada em concurso internacional em contos e cronicas, Três livros publicados e uma coletânea do concurso Edições AG. Mora em Florianópolis, na ilha, casada, três filhos, gosta de animais domésticos, de cultivar plantas, reunir os amigos, viajar, leitura, cinema, e a paixão de escrever.

2 comentários:

Teresa Raquel disse...

Porra, que mulher fria e calculista hein, parece a filomena ferreto personagem de Aracy Balabanian de a próxima vítma, mas realmente existe a lei do retorno,trocou a esposa, trocou a amante, pela bem novinha e a novinha deu um pé na bunda do cara, é a lei do retorno

Família Escóssia disse...

Adorei muito!!