Sol, mar e a chuva, este é o tema norteador do
texo que Julia deve entregar ainda esta semana. O seu editor não quer saber de
esticar o prazo, ela assinou um contrato que deve ser cumprido à risca, porém,
Julia está tentando trabalhar e nada acontece. Ninguém quer saber de nascer. É!
Os contos de Julia são paridos a duras penas. Julia pensa que dever a aura da
casa nova que está a mexer com seus neurônios. Ela está morando em local privilegiado,
defronte a um bosque onde corre um igarapé, a rua é muito bonita, não tem
trânsito, só os moradores trafegam. Na rua Tanajura a casa de Julia é a de
número 4110. A
rua tem onze casas e seis já foram assaltadas. Assalto a mar armada. E em cada
esquina tem uma guarita, O guarda fecha a janela da guarita para assistir
televisão. O marido de Julia já reclamou, pois ele paga a vigilância, porem o
guarda disse que vê através da persiana. Pois é. As guaritas do bairro de Julia
não tem vidros, tem persiana. É aí que mora o perigo. O marido de Julia tentou
argumentar, Julia ficou com medo dos guardas, Penso que é isso que está
embaralhando os seus pensamentos. Julia chegou à seguinte conclusão: este vai
ser um parto de elefante! Julia está casada a dez anos e nesses dez anos ela
vem sonhando com a venda de uma de suas histórias para o cinema, ou TV, mas...
até agora... Julia também anda preocupada com o andar de seu casamento. Anda
tudo muito morno. Zazu se não está na frente do computador, está assistindo TV.
Se não é TV são os fones de ouvido que Zazu usa e Julia fala com as paredes.
Julia está planejando uma viagem à Terra Santa e vai sozinha. Segundo ela vai
tentar aprender a falar com as paredes. Zazu acha graça. Julia já perdeu as contas de quanto está gastando
com esteticista, colorista, curso de auto maquiagem, corte de cabelo, e o
figurino nem se fala. Pelas contas de Julia se ela não vender logo suas
histórias, a sua vaquinha vai para o brejo. Ou pior, seu brejo particular pode
aumentar de tantos sapos que anda engolindo. E tudo por conta dos fones de ouvido
de Zazu e do celular que ele anda atendendo no banheiro. Na casa nova eles não
tem telefone fixo, só usam celular. Segundo Zazu para que telefone fixo, estão
incomunicáveis. Zazu usa o computador do escritório e aproveita e faz um
rastreamento nas páginas favoritas de Julia. O que ele pensa que deve
interessar para a mulher, ele imprime e entrega a ela. Ele é o dono da
situação, as amigas de Julia dizem não dar notícias porque é super chato saber
que Zazu está entre elas e sem liberdade, sem notícias. Porem o celular de Zazu
este ele atende, longe da mulher; se ela pergunta quem era ele diz que são
besteiras da companhia de propagandas. Julia finge que acredita porem pensa:
Ah! Se eu encontro o João Ubaldo no meu caminho, você vai ver o sorriso do lagarto,
porem enquanto não acontece, ela que deu para andar pelas esquinas à espreita,
pois nunca se sabe! Vai que o João Ubaldo apareça para dar uma palestra e
descobre que a Julia existe e que anda a perigo? Pois aí é que o babaca do Zazu
vai ver o que é bom para a dengue. Enquanto isso não acontece, Julia vai
levando a vida em fogo brando. Julia gosta de mar. Nossa! O mar é um tema
vastíssimo. Ela até já imaginou o encontro com o João Ubaldo em uma praia
deserta esperando pelos dois. Julia gosta de sol, porém de chapéu e muito
filtro solar. E o cheiro da chuva que delícia! O cheiro da terra molhada! Porém
ela está pensando é no João Ubaldo e cantarolando sol e mar, sol e mar. A gente
brincando e se amando! Chove chuva, chove sem parar. O João Ubaldo você o sol
da minha vida! Nossa! Que cafonice!
Julia sente o abraço do amado em torno do seu corpo. O abraço vai se tornando
mais urgente e ela se aconchega e sente desejo. Ela deseja ser amada, pensa
hoje vou fazer amor, deixo para escrever amanhã. Sente a boca do amado no seu
pescoço ela sabe que ele está usando Kenzo. Ela sente-se desejável, estende o
braço para acender a luz e olhar para o rosto amado e desejado. O abajur caiu
de seus dedos trêmulos. Na queda a lâmpada explode e o clarão ilumina o
travesseiro ao lado. Os cabelos não são escuros como do João Ubaldo e nem
castanhos como os de Zazu. São ruivos e ondulados, como? É o kocker de Julia
que entrou no quarto e deitou ao seu lado. Julia pensa, acorda Alice! Julia
levanta e vai tomar um banho frio e de cabeça molhada vai até a cozinha e toma
um café forte. Sem Zazu. Sem João Ubaldo. Pensa: ô mulher você está me saindo
uma safada, toma vergonha! Que o dia já se vai pela metade e você não escreveu
nada até agora! E se o seu editor se cansa de esperar, você está frita. Julia
senta e começa escrever, recorda a Riviera Francesa, lembra dos dias que passou
em Cannes, Nice. Lembra do festival de cinema, da praia linda próxima do
Palácio dos Festivais. Tudo tão belo para receber os convidados e os candidatos
à Palma de Ouro. Lembra do restaurante onde jantou e do coquetel super
produzido, azul, que até parecia uma alegoria de escola de samba, porém muito
saboroso e da piramidal
sobremesa. Das caminhadas pela praia pisando nos
seixos (não era areia eram pedras), A sola do pé doía a cada passo. Lembra da
corrida de formula 1 em Monte Carlo. Lembrou que pisou no tapete vermelho,
graças a prima do seu marido que é do ramo. A família é dona de salas de cinema
e distribuidores de filmes. Foi lá que Julia se envolveu na arte da perfumaria.
Julia sentiu todos os aromas e a mágica. Ela e Zazu estavam tão felizes. Julia
estava bela e ainda não sonhava com o João Ubaldo e Zazu ainda não atendia o
celular no banheiro. Foram outros tempos. Julia não mais voltou à Riviera Francesa,
passou a caminhar à beira da praia dos Ingleses, que também é muito bonito e
hoje toma sol no norte do país, onde também chove na época da friagem, e também
tem seus encantos, neste Brasil de muitas faces. Para Julia ser feliz só falta
o mar. Finalmente Julia encontrou a formula mágica e deu conta do primeiro
parágrafo. E viva o povo brasileiro! João Ubaldo.
Restaurandora
de bens culturais, pintora, escultora, ourives, Em 2010 foi
classificada em concurso internacional em contos e cronicas, Três livros
publicados e uma coletânea do concurso Edições AG. Mora em Florianópolis, na ilha, casada, três filhos, gosta de animais
domésticos, de cultivar plantas, reunir os amigos, viajar, leitura,
cinema, e a paixão de escrever.
Um comentário:
Boa noite!!
Mto legal a história da vida de Julia.Gostei qdo ela fala no João Ubaldo.A autora do texto, Nádia Foes, é bem criativa.Nas entrelinhas nos identificamos com Julia em algumas situações, que ela passou em sua vida..
Um abraço,
Ana Maria
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