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sexta-feira, 18 de maio de 2012

Sol, mar e a chuva - Nadia Foes

Sol, mar e a chuva, este é o tema norteador do texo que Julia deve entregar ainda esta semana. O seu editor não quer saber de esticar o prazo, ela assinou um contrato que deve ser cumprido à risca, porém, Julia está tentando trabalhar e nada acontece. Ninguém quer saber de nascer. É! Os contos de Julia são paridos a duras penas. Julia pensa que dever a aura da casa nova que está a mexer com seus neurônios. Ela está morando em local privilegiado, defronte a um bosque onde corre um igarapé, a rua é muito bonita, não tem trânsito, só os moradores trafegam. Na rua Tanajura a casa de Julia é a de número 4110. A rua tem onze casas e seis já foram assaltadas. Assalto a mar armada. E em cada esquina tem uma guarita, O guarda fecha a janela da guarita para assistir televisão. O marido de Julia já reclamou, pois ele paga a vigilância, porem o guarda disse que vê através da persiana. Pois é. As guaritas do bairro de Julia não tem vidros, tem persiana. É aí que mora o perigo. O marido de Julia tentou argumentar, Julia ficou com medo dos guardas, Penso que é isso que está embaralhando os seus pensamentos. Julia chegou à seguinte conclusão: este vai ser um parto de elefante! Julia está casada a dez anos e nesses dez anos ela vem sonhando com a venda de uma de suas histórias para o cinema, ou TV, mas... até agora... Julia também anda preocupada com o andar de seu casamento. Anda tudo muito morno. Zazu se não está na frente do computador, está assistindo TV. Se não é TV são os fones de ouvido que Zazu usa e Julia fala com as paredes. Julia está planejando uma viagem à Terra Santa e vai sozinha. Segundo ela vai tentar aprender a falar com as paredes. Zazu acha graça. Julia  já perdeu as contas de quanto está gastando com esteticista, colorista, curso de auto maquiagem, corte de cabelo, e o figurino nem se fala. Pelas contas de Julia se ela não vender logo suas histórias, a sua vaquinha vai para o brejo. Ou pior, seu brejo particular pode aumentar de tantos sapos que anda engolindo. E tudo por conta dos fones de ouvido de Zazu e do celular que ele anda atendendo no banheiro. Na casa nova eles não tem telefone fixo, só usam celular. Segundo Zazu para que telefone fixo, estão incomunicáveis. Zazu usa o computador do escritório e aproveita e faz um rastreamento nas páginas favoritas de Julia. O que ele pensa que deve interessar para a mulher, ele imprime e entrega a ela. Ele é o dono da situação, as amigas de Julia dizem não dar notícias porque é super chato saber que Zazu está entre elas e sem liberdade, sem notícias. Porem o celular de Zazu este ele atende, longe da mulher; se ela pergunta quem era ele diz que são besteiras da companhia de propagandas. Julia finge que acredita porem pensa: Ah! Se eu encontro o João Ubaldo no meu caminho, você vai ver o sorriso do lagarto, porem enquanto não acontece, ela que deu para andar pelas esquinas à espreita, pois nunca se sabe! Vai que o João Ubaldo apareça para dar uma palestra e descobre que a Julia existe e que anda a perigo? Pois aí é que o babaca do Zazu vai ver o que é bom para a dengue. Enquanto isso não acontece, Julia vai levando a vida em fogo brando. Julia gosta de mar. Nossa! O mar é um tema vastíssimo. Ela até já imaginou o encontro com o João Ubaldo em uma praia deserta esperando pelos dois. Julia gosta de sol, porém de chapéu e muito filtro solar. E o cheiro da chuva que delícia! O cheiro da terra molhada! Porém ela está pensando é no João Ubaldo e cantarolando sol e mar, sol e mar. A gente brincando e se amando! Chove chuva, chove sem parar. O João Ubaldo você o sol da minha vida! Nossa! Que  cafonice! Julia sente o abraço do amado em torno do seu corpo. O abraço vai se tornando mais urgente e ela se aconchega e sente desejo. Ela deseja ser amada, pensa hoje vou fazer amor, deixo para escrever amanhã. Sente a boca do amado no seu pescoço ela sabe que ele está usando Kenzo. Ela sente-se desejável, estende o braço para acender a luz e olhar para o rosto amado e desejado. O abajur caiu de seus dedos trêmulos. Na queda a lâmpada explode e o clarão ilumina o travesseiro ao lado. Os cabelos não são escuros como do João Ubaldo e nem castanhos como os de Zazu. São ruivos e ondulados, como? É o kocker de Julia que entrou no quarto e deitou ao seu lado. Julia pensa, acorda Alice! Julia levanta e vai tomar um banho frio e de cabeça molhada vai até a cozinha e toma um café forte. Sem Zazu. Sem João Ubaldo. Pensa: ô mulher você está me saindo uma safada, toma vergonha! Que o dia já se vai pela metade e você não escreveu nada até agora! E se o seu editor se cansa de esperar, você está frita. Julia senta e começa escrever, recorda a Riviera Francesa, lembra dos dias que passou em Cannes, Nice. Lembra do festival de cinema, da praia linda próxima do Palácio dos Festivais. Tudo tão belo para receber os convidados e os candidatos à Palma de Ouro. Lembra do restaurante onde jantou e do coquetel super produzido, azul, que até parecia uma alegoria de escola de samba, porém muito saboroso e da piramidal 
sobremesa. Das caminhadas pela praia pisando nos seixos (não era areia eram pedras), A sola do pé doía a cada passo. Lembra da corrida de formula 1 em Monte Carlo. Lembrou que pisou no tapete vermelho, graças a prima do seu marido que é do ramo. A família é dona de salas de cinema e distribuidores de filmes. Foi lá que Julia se envolveu na arte da perfumaria. Julia sentiu todos os aromas e a mágica. Ela e Zazu estavam tão felizes. Julia estava bela e ainda não sonhava com o João Ubaldo e Zazu ainda não atendia o celular no banheiro. Foram outros tempos. Julia não mais voltou à Riviera Francesa, passou a caminhar à beira da praia dos Ingleses, que também é muito bonito e hoje toma sol no norte do país, onde também chove na época da friagem, e também tem seus encantos, neste Brasil de muitas faces. Para Julia ser feliz só falta o mar. Finalmente Julia encontrou a formula mágica e deu conta do primeiro parágrafo. E viva o povo brasileiro! João Ubaldo.


Restaurandora de bens culturais, pintora, escultora, ourives, Em 2010 foi classificada em concurso internacional em contos e cronicas, Três livros publicados e uma coletânea do concurso Edições AG. Mora em Florianópolis, na ilha, casada, três filhos, gosta de animais domésticos, de cultivar plantas, reunir os amigos, viajar, leitura, cinema, e a paixão de escrever.

Um comentário:

Nana disse...

Boa noite!!
Mto legal a história da vida de Julia.Gostei qdo ela fala no João Ubaldo.A autora do texto, Nádia Foes, é bem criativa.Nas entrelinhas nos identificamos com Julia em algumas situações, que ela passou em sua vida..
Um abraço,
Ana Maria