O mundo nunca foi tão adolescente. A cada quatro terráqueos, um tem
entre 10 e 24 anos. São 1,8 bilhão de pessoas nessa idade especial. Mas
desde quando um marmanjo de 24 anos é adolescente? Num passado recente
não era, mas passou a ser -ou melhor, não deixou de ser. E isso pode
virar um problema. Segundo a revista científica “The Lancet”, a
adolescência vem espichando a cada geração, nas duas pontas: a puberdade
chega mais cedo, e a maturação do papel social dos jovens ocorre cada
vez mais tarde.
Basta observar como tem avançado a idade média dos jovens ao terminar
os estudos, com que conseguem seu primeiro emprego fixo, quando se
casam, e com que as mulheres se tornam mães. Todos esses marcos do fim
da adolescência foram adiados nas últimas gerações. As repercussões
sociais dessa mudança são maiores do que nos damos conta. Daí o dossiê
da “The Lancet”.
A palavra “adolescente” deriva do latim “adolescere”, que significa
“crescer”, “desenvolver-se”. Adolescente é quem está crescendo, e
adulto, quem já cresceu, já se desenvolveu. Mas o crescimento não se
mede pelo número do sapato nem pelo comprimento da barra da calça ou da
saia. É uma questão de amadurecimento, de andar com as próprias pernas
sem a muleta dos pais.
A adolescência começa quando os hormônios da puberdade mudam a
fisiologia e a fisionomia das crianças. É uma revolução que transforma
todo o corpo, com repercussões do comportamento à capacidade cognitiva
do cérebro. Jovens púberes, por exemplo, tendem a questionar regras,
buscar novas experiências e tomar atitudes de risco com mais frequência
que os impúberes.
O coquetel hormonal em ebulição tem impactos diretos sobre a
mortalidade. O gosto por arriscar-se faz com que os adolescentes estejam
entre as principais vítimas das mortes violentas. Se a adolescência se
prolonga, a chance de sucumbir aos seus efeitos também. Nas últimas
décadas, o mundo conseguiu reduzir drasticamente a morte na infância.
Mas os avanços na redução da mortalidade de adolescentes foram bem menos
impressionantes. O Brasil não é exceção.
De 1996 a 2010, as mortes de crianças brasileiras com menos de cinco
anos caíram praticamente à metade, de 88 mil para 47 mil por ano. A taxa
de mortalidade por 100 mil habitantes dessa faixa etária regrediu quase
na mesma proporção. Já as mortes e a mortalidade de adolescentes de 10 a
24 anos permaneceram estáveis. Em 2008, pela primeira vez na história
do Brasil, morreram mais adolescentes do que crianças. E a tendência só
se acentuou desde então.
Nesses 15 anos, as mortes por causas naturais diminuíram, e as
violentas aumentaram. Morreram mais adolescentes brasileiros por tiro e
acidentes de carro e moto, e menos por doenças infecciosas como Aids, ou
por problemas cardíacos. Foram e continuam sendo vítimas de causas de
morte evitáveis, que podem ser amainadas por políticas públicas. Esse
não é o único impacto sobre a longevidade. É na adolescência que se
formam os hábitos alimentares que vão influenciar a saúde pelo resto da
vida.
A adolescência tardia também tem consequências positivas,
principalmente econômicas. A extensão do período sob o mesmo teto dos
pais permite aos adolescentes permanecerem mais tempo na escola. Por
isso as novas gerações têm potencial para formarem a força de trabalho
mais qualificada que o Brasil já teve, com impactos positivos sobre a
produtividade e a renda. Mas para esse potencial se concretizar é
preciso que haja oportunidades de emprego compatíveis com essa
escolaridade mais alta.
O ano de 2011 foi rico em exemplos de como a adolescência estendida
tem impactos profundos sobre áreas improváveis, como a política. Os
levantes árabes foram impulsionados por essa população adolescente,
gente tão jovem quanto os indignados espanhóis, os saqueadores de
Londres e os ocupadores de Wall Street. Todos eles buscando seu lugar na
sociedade e topando com obstáculos maiores do que seus pais para
encontrá-lo. E enquanto não encontram, sua adolescência é interminável.
Fonte: Estadão
3 comentários:
Esse fenômeno é algo mais conhecido nos países latinos. Conheci uma inglesa que ficava encantada com isso: ela viajou boa parte do mundo e sozinha desde a maioridade e acreditava que esse apego era importante.
Antigamente os pais eram mais rígidos com os filhos. A maioria só esperava o filho completar 18 anos pra mandá-lo tomar conta da própria vida, mesmo sob os protestos das mães, sempre mais apegadas e amorosas e sem muita voz na família. Hoje, o que maioria quer é vê-los formados e bem empregados antes de deixarem o lar e enquanto isso não acontece, vão ficando sob a proteção paterno-maternal.
Boa tarde!
Realmente, hoje a adolescência é interminável...
Se pensarmos bem,por um lado houve uma maior preocupação da sociedade contemporânea com a infância e a adolescência, pois até poucos anos atrás não havia um respaldo para essas faixas etárias.Por outro lado, vivenciamos a dependêcia e a imaturidade deles por um período mais longo,em companhia dos pais. Creio que, todos esses fatores foram e saõ ocasionados pela transição da sociedade.Não temos como retroceder e sim continuar a aprender como lidar nos dias de hoje com a infância e a adolescência e por que não com a juventude?
Um abraço,
Ana Maria
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