Poucas pessoas gostam de viajar sozinhas. O que é compreensível: a
melhor modalidade é a dois, também acho. Mas, na ausência momentânea de
parceria, por que desconsiderar uma lua de mel consigo mesmo?
Uma amiga psicanalista me disse que não é por medo que as pessoas
não viajam sozinhas, e sim por vergonha. Faz sentido: numa sociedade que
condena a solidão como se fosse uma doença, é natural que as pessoas se
sintam desconfortáveis ao circularem desacompanhadas, dando a impressão
de serem portadoras de algum vírus contagioso. Pena. Tão preocupadas
com sua autoimagem, perdem de se conhecer mais profundamente e de se
divertir com elas próprias.
Vivi recentemente essa experiência. Tirei 10 dias de férias, e não
diga que não reparou, ou morrerei de desgosto. Estive em lugares que já
conhecia para não me sentir obrigada a conferir as atrações turísticas _
o “aproveitar” não precisa necessariamente ser dinâmico, podemos
aproveitar o sossego também.
Minha intenção era apenas flanar, ler, rever amigos que moram longe e
observar a vida acontecendo ao redor, sem pressa, sem mapas, sem guias.
Dormir até mais tarde e almoçar na hora em que batesse a fome, se
batesse. Estar disponível para conversar com estranhos, perceber o
entorno de forma mais aguçada, circular de bicicleta por cidades
estrangeiras. Ave, bicicleta! Diante do incremento de turistas no mundo,
não raro impossibilitando a contemplação de certos pontos, alugar uma
bike às 7h30min foi a solução para curtir ruas vazias e silenciosas.
Solitários, somos todos, faz parte da nossa essência. Não é um
defeito de fabricação ou prova de nossa inadequação ao mundo, ao
contrário: muitas vezes, a solidão confirma nossa dignidade quando não
se está a fim de negociar nossos desejos em troca de companhia
temporária. E a propósito: quem disse que, sozinho, não se está
igualmente comprometido?
Numa praça em Roma, um casal de brasileiros se aproximou. Começamos a
conversar. Lá pelas tantas, perguntei de onde eles eram. “De São Paulo,
e você?” Respondi: “Nós, de Porto Alegre”. Nós!!! Quanta risada rendeu
esse ato falho. Eu e eu. Dupla imbatível, amor eterno, afinidade total.
Se você não se atura, melhor não viajar em sua própria companhia.
Mas se está tudo bem entre “vocês”, saiam por aí e descubram como é bom
sentar num café num dia de sol, pedir algo para beber enquanto lê um bom
livro, subir até terraços para apreciar vistas deslumbrantes, entrar em
lojas e ficar lá dentro o tempo que desejar, entrar num museu e sair
dali quando bem entender, caminhar sem trajeto definido nem hora pra
voltar, pedalar ao longo de um rio ouvindo suas músicas preferidas no
iPod, em conexão com seus pensamentos e sentimentos, nada mais.
Vergonha? Senti poucas vezes na vida, quando não me reconheci dentro
da própria pele. Mas estando em mim, sob qualquer circunstância, jamais
estarei só.
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