Foi absolutamente inesperado; eu ia andando, ele vinha de outra rua, e quase nos esbarramos, o que felizmente não aconteceu. Apesar do passar do tempo, nem por um minuto duvidei de que fosse ele. Quando nos conhecemos, ele devia ter uns 30 anos, mais uns 20 tinham se passado e ele estava mais bonito do que havia sido. Os cabelos um pouco grisalhos, os traços mais firmes, de homem, e o corpo, o mesmo. Ah, que boa história foi aquela.
Não foi um caso de paixão, mas sim de amor, amor romântico. Terá durado um mês, dois? A verdade é que naquele tempo uma viagem a Paris tinha que ter, obrigatoriamente, um namoro. Nos víamos todos os dias e, quando o revi, lembrei do fim de semana que passamos em Deauville em pleno outono, as florestas que percorremos com as árvores em tons que iam do amarelo ao vermelho, passando por todos os tons de castanho, que lindas lembranças. Depois a volta, já com os dias contados para eu voltar.
Não se falava disso, claro, e houve a penúltima noite, e a última, e nos separamos sabendo que seria para sempre; calados, pois não havia nada a dizer, nem planos a fazer. Apenas sofremos, de mãos dadas e sem coragem de nos olhar. O tempo passou e a lembrança ficou.
Mas nunca me esqueci dele; não totalmente. Dos passeios no Luxembourg, dos cafés onde nos sentávamos durante horas contando nossas vidas, falando do passado, mas sem ousar falar de futuro, pois o futuro para nós era fora de questão. Foi um amor lindo, inesquecível, e nunca mais nos vimos nem nos escrevemos, nada. E ali estava ele, a dois passos de mim.
Teria ele se casado? Continuaria só? Se lembraria de mim, pelo menos às vezes? Tive vontade de correr para ele, mas e a coragem? Lembrei da música de Chico que diz que é desconcertante rever um grande amor. E como é.
Vi quando entrou num edifício e fiquei por ali, disfarçando, esperando que ele saísse, o que aconteceu uma meia hora depois. Durante esse tempo meu coração bateu loucamente, e eu pensava: falo com ele ou não? E se ele me der um olhar gelado? Afinal, tantos anos depois, tantas coisas devem ter acontecido em sua vida. Quando ele enfim saiu, ainda o segui por uns minutos, mas pensei: calma, Danuza, o que passou, passou. Não para todos, não para mim, mas coração de homem é diferente.
Ele parou na rua, fez sinal para um taxi. Era agora ou nunca, e foi nunca. Tive medo de que ele me tratasse friamente, como uma amiga, ou demorasse a me reconhecer.
Ou pior, que não me reconhecesse.
Na última vez em que estive em Paris, comprei, como faço sempre, as revistas locais, inclusive a Paris Match, onde ele trabalhava. E, folheando a revista, vi um texto com uma pequena foto dele -que custei a reconhecer-, e o título: So Long, Bernard. Era uma despedida da revista onde ele trabalhou a vida toda.
Eu podia ter falado com ele, devia ter falado com ele. Ou não? Que mania, essa, de não aceitar que as coisas se acabem completamente, por que isso? E tenho pensado nele, muito mais do que quando nos separamos séculos atrás.
São tantas as perguntas, e tão poucas as respostas.
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