O urologista, que cuida da saúde do
"PIB" brasileiro, fala sobre os principais temores masculinos, como
problemas na próstata, disfunções sexuais e decadência física. Não tem
nem o que questionar: quando se fala em urologia, e principalmente em
saúde masculina, primeiro nome da agenda e da confiança dos principais
políticos, empresários e brasileiros em geral é o do médico Miguel
Srougi. Considerado o número 1 do Brasil em Cirurgias de câncer de
próstata (já realizou 2.900), atende em seu consultório gente como o
presidente Lula, José Alencar, José Serra, Geraldo Alckmin, Joseph
Safra, Lázaro Brandão, Abílio Diniz e Antônio Ermírio de Moraes, entre
outros pesos pesados.
Professor titular de urologia da Faculdade de
Medicina da USP, pós-graduado pela Harvard Medical School, em Boston,
nos Estados Unidos, 35 anos de carreira,
uma dezena de livros publicados e outra centena de artigos espalhados
mundo afora, Srougi tem a simplicidade daqueles que muito sabem, pouco
ostentam e continuam lutando.
Ele se dedica integralmente ao que
faz - trabalha todos os dias, das 7 da manhã às 10 da noite -, abriu mão
da vida pessoal - é casado, pai de dois filhos - e não tem receio de
dizer que se envolve demais com seus pacientes. "Sofro muito e esse
sofrimento é um dos fatores de sucesso da minha carreira, porque acabo
me entregando mais aos doentes." Embora viva intensamente entre os
limites das dores da perda e alegrias dos resgates da vida, Srougi, aos
60 anos, se abastece lecionando na Faculdade de Medicina, "uma de minhas
razões existenciais".
No ano passado inaugurou um moderno centro de
ensino e pesquisa para seus alunos, garimpando verbas junto aos seus
pacientes poderosos. A sala ganhou o nome de Vicky Safra, mulher de
Joseph Safra - em homenagem ao banqueiro
que doou a maior parte dos recursos. Nesta entrevista, o maior
especialista em câncer de próstata do país afirma que "todo homem nasce
programado para ter a doença" e que, se viver até os 100 anos,
inevitavelmente vai contraí- la.
Fala ainda sobre medos, fantasmas
masculinos, impotência, novos tratamentos e seus sonhos pessoais. E
conta por que trocou o Hospital Sírio-Libanês pelo Oswaldo Cruz depois
de 30 anos. A seguir, os principais trechos.
ASSOMBROS MASCULINOS
Os
homens têm uma certa sensação de invulnerabilidade - isso faz parte da
cabeça deles. Passam boa parte da sua vida livre de todos os incômodos
que a mulher tem, fazendo com que relaxem mais com a sua saúde. Com o
passar dos anos, começam a perceber a sua vulnerabilidade e passam a
dar um pouco mais de valor aos cuidados
médicos.
O que mais os atemoriza hoje? Problemas com a próstata,
disfunções sexuais e a decadência física, que mexe muito com a cabeça
das mulheres, mas também com a deles. As mulheres pautam muito a vida em
função da beleza e os homens, da força, da virilidade, da capacidade de
agir, raciocinar.
E na hora em que surgem falhas nessas áreas, ele percebe que, talvez, não seja aquele ser imortal que achava que fosse.
ENVELHECIMENTO
Há
dois profundos temores hoje nos homens: o primeiro é o crescimento
benigno da próstata, um fenômeno que ocorre em praticamente todos eles:
ela aumenta de tamanho depois dos 40 anos e, dessa forma, o canal da
uretra fica ocluído.
Isso faz com que o homem comece a urinar sucessivas vezes, a não ficar em uma reunião prolongada, tem de levantar à noite,
prejudica o sono, acorda mal, pode ter descontroles de urina.
O
crescimento benigno é quase inexorável: todos os homens vão ter em maior
ou menor grau - felizmente, apenas um terço, 30%, tem sintomas mais
significativos que exigem apoio médico.
Nesses casos, há medicações
que desobstruem parcialmente a uretra e fazem o indivíduo urinar e viver
melhor; apenas de 4% a 5% dos homens têm de fazer uma cirurgia para
desobstruir a uretra por causa desse crescimento benigno.
Essa é
uma cirurgia, que se faz com segurança e sem os inconvenientes de uma
cirurgia maior nos casos de câncer. Ela remove apenas o fator
obstrutivo, o homem passa a viver melhor e sem nenhuma seqüela. Esse
crescimento não tem causa conhecida, surge por um desequilíbrio hormonal
no homem maduro, ou seja, as células da próstata passam a se proliferar
em decorrência dos hormônios. Não tem como prevenir. Existem algumas
medidas, mas nenhuma
consistente.
OBESOS E FUMANTES
Existe
a idéia de que o obeso e os fumantes teriam menos crescimento benigno
da próstata. O que é interessante é que a próstata seria o único lugar
no organismo que eles deixam de ter todas as desvantagens, mas a
realidade é meio dura: recentemente se apurou que eles são menos
operados da próstata, mas não porque ela não cresce, mas pelo receio dos
médicos de operá-los porque complicam mais e também porque muitas vezes
não vivem o suficiente para ser operados - morrem antes. É uma
realidade perversa.
REALIDADE NUA E CRUA
O
câncer na próstata adquire maior relevância porque tem uma grande
prevalência: 18% dos homens - um em cada seis -
manifestarão a doença. E também porque o tumor, que ocorre com muita
freqüência dentro da próstata, é eliminado com sucesso em 80%, 90% dos
homens. Se esse tumor não é identificado no momento certo e se expande,
saindo para fora da próstata, as chances de cura caem para 30%.
É um tumor muito comum e se for detectado a tempo, tem como resgatar esse paciente.
Dos
18%, somente 3% morrem - a medicina consegue curar 15% dos homens,ou
seja, a maioria. Mas vale dizer que todo homem nasce programado para ter
câncer de próstata.
Ou seja, nós temos, nas nossas células, genes
que as estimulam a virar cancerosas e eles ficam bloqueados durante a
nossa existência. Quando o indivíduo envelhece, esses mecanismos de
bloqueio deixam de exercer o seu papel e o câncer começa a se
manifestar. Com isso vai aumentando a freqüência da doença e todo homem
que chegar aos 100 anos vai ter câncer de próstata.
SEM FANTASIA
O
exame de toque - um dos meios de se detectar a doença - gera na cabeça
dos homens fantasias negativas e receios, mas, na verdade, eles tem
muito medo da dor. Tanto é que os que fazem pela primeira vez, no ano
seguinte perdem o medo. Leva três ou quatro segundos e não dói. Então,
um dos fatores de resistência é eliminado. Existe um segundo sentimento,
que é muito forte: expressar, exteriorizar uma fraqueza se a doença for
descoberta.
O homem tem pavor disso porque, de acordo com todas as
idéias evolucionistas, só vão sobreviver aqueles que forem fortes. É
comum você descobrir um câncer no indivíduo, e ele entrar em pânico, não
pela doença, mas porque as pessoas vão descobri-la. Porque o câncer é
muito relacionado com morte, decadência física, perda da independência,
dependência dos outros. O homem não
aceita essa idéia, e prefere fechar os olhos e enfiar a cabeça debaixo
da terra a enfrentar, mostrando para o mundo e às pessoas que ele é um
ser mais fraco.
Isso vai afetar a imagem dele, acha que vai perder
poder sobre outras pessoas, porque ninguém obedece a um fraco, alguém
que vai morrer.
Isso vai contra a idéia que temos de ser mais fortes para sobreviver.
A PERFORMANCE DO ROBÔ
Estamos
fazendo cirurgias com robô, que permite uma visão muito mais precisa do
campo cirúrgico, elimina os tremores da mão do cirurgião, permite
incisões pequenas, uma operação muito mais perfeita porque os movimentos
dele são muito suaves. Isso é muito novo no Brasil. Fiz o primeiro caso
há dois meses, no Sírio-Libanês. E agora, o Albert Einstein tem e o
Oswaldo Cruz está adquirindo.
Nos Estados Unidos se faz
cirurgia robótica em larga escala. Lá, o robô ganha em performance do cirurgião médio, mas ele ainda perde do habilitado.
Tenho
mais de 2.900 pacientes operados de câncer de próstata pessoalmente. Eu
sou o terceiro cirurgião do mundo nesse quesito - só perco para dois
americanos e eles estão parando de trabalhar. Apesar de ter essa grande
experiência, quando comecei a operar, 35% ficavam com incontinência
urinária grave. Agora são só 3%. Impotentes, todos também ficavam. Hoje,
se o homem tem menos de 55 anos, a incidência é de 20% - antes era
100%.
Há também enxertos de nervos, porque a impotência se deve à
remoção de dois nervos que passam perto da próstata e nós estamos
fazendo esse enxerto quando somos obrigados a retirá-los nos casos em
que o tumor fica grudado. Entre os pacientes que fizeram os enxertos,
metade voltou a ter ereções com o tempo.
IMPOTÊNCIA, O QUE FAZER?
Esses
novos remédios para tratar a disfunção sexual contornam 1/3 da
impotência, tanto após a cirurgia quanto depois da radioterapia. Se os
comprimidos não atuarem, existem injeções.
Há ainda próteses
penianas que são muito desenvolvidas e produzem uma ereção que quase não
tem nenhuma diferença em relação à normal.
Isso permite que o homem
reassuma a vida sexual plenamente e que as mulheres tenham muita
satisfação. Os homens ficam extremamente felizes - são hastes colocadas
dentro do pênis. Não fica marca, nem cicatriz.
Nos Estados Unidos,
entrevistaram as mulheres sobre os homens que tinham prótese e as
respostas foram positivas. Ela funciona muito bem.
O PAPEL DAS MULHERES
Os
homens são resistentes: eles relutam muito em ir ao médico fazer um
exame de próstata e só vão quando a mulher os empurra: dois terços dos
pacientes no consultório de Miguel Srougi são trazidos por elas.
"Ligam
para marcar a consulta, os acompanham. A gente não vê mulheres jovens
trazendo homens jovens para fazer exames. A gente vê mulheres maduras.
Claro que o jovem não está na faixa de risco. Mas existe um outro
significado da importância da mulher. Primeiro, que ela é pragmática e
incentiva o marido." Mas, por que ela quer isso? "Porque quem ficou
vivendo bem 30 anos e conseguiu superar todos os embates da vida
conjugal é um casal que o tempo consolidou. E aí a mulher tem um sentido
de preservação da família muito mais forte que o do homem. Passadas as
tempestades e oscilações do relacionamento, ela não quer que o marido
morra. É real. Toda vez que tenho um paciente ofereço dois tratamentos:
um que aumente a existência dele, mas vai, por exemplo, causar alguma
deficiência na área sexual.
E um outro, que cura menos, mas preserva
melhor a parte sexual. O homem balança na decisão. A mulher nunca
hesita. Ela prefere aquele que aumenta a existência, mesmo correndo o
risco de comprometer a vida sexual dele e do casal. Poucas vezes vi uma
mulher aconselhar um tratamento que dê menos chance de vida e aumente a
possibilidade de ele ficar potente. Dá para contar nos dedos. Ela quer o
companheiro, quer preservar aquela pirâmide que foi construída, que é
rica."
SOFRIMENTOS E PRIVILÉGIOS
Eu
me envolvo muito com meus pacientes. Sofro muito. E esse sofrimento é
um dos fatores do sucesso da minha carreira, de 35 anos. Nesse
sofrimento eu
acabo me entregando mais e mais aos doentes. Isso é ruim, porque não
tenho vida pessoal, minha vida familiar é feita nos intervalos.
Felizmente, os momentos bons prevalecem sobre os ruins. É por isso que
eu sobrevivo. Um doente que coloca a cabeça no meu ombro e agradece por
ter feito algo por ele, ou deixa correr uma lágrima na minha frente, me
faz deletar, superar aqueles momentos em que me senti totalmente
impotente.
Uma das coisas importantes é o médico saber e demonstrar
que a medicina não é infalível e ele não se sentir onipotente. O
urologista tem um privilégio. O oncologista mexe com câncer avançado, já
no fim do caminho - eu lido com o inicial. Eu consigo salvar muita
gente. É um privilégio para mim.
MEDO DA SEPARAÇÃO
Nós
não queremos morrer. Primeiro, pela incerteza do porvir. Segundo,
porque a morte implica extinção e o ser humano não aceita a
aniquilação. A nossa cabeça nasceu para ser imortal. A morte está
relacionada com dor, sofrimento, à decadência física, à desfiguração, à
perda do papel social, desamparo da família, perdas dos prazeres
materiais, da independência. Mas a causa verdadeira é o nosso horror de
nos separar das pessoas que amamos. Bem material não deixa ninguém
feliz.
Há tanta gente rica se suicidando, tomando droga para sair da
realidade. Os médicos não compreendem isso. Se as pessoas têm medo de se
afastar das pessoas do seu entorno, você precisa tratar o entorno
também. Não é o médico que apóia o doente nas fases difíceis - é a
família.
Eles reagem raivosamente contra a família, querem afastá-la
do processo, sem perceber que um doente só vai ter paz, tendo a morte
pela frente ou não, se a família estiver ao lado.
A SAÍDA DO SÍRIO-LIBANÊS
Os
verdadeiros templos na Terra são os hospitais - não as igrejas. Nas
igrejas tem muito ouro, riqueza. Aqui não, você conhece o sofrimento, o
valor da existência humana. Os orgulhosos e os soberbos ficam humildes,
ricos e pobres são iguais; os ruins, os autoritários e os maldosos se
tornam condescendentes: eles ficam despidos, tiram a máscara; é aqui que
você conhece o que é viver, que resgata para a vida, não em uma igreja
qualquer, que o sujeito entra lá, reza dez minutos e sai. Ele pode até
sarar, cicatrizar a sua alma.
Mas aqui nós curamos a alma e o corpo.
Esse é o verdadeiro templo, onde o ouro é a vida. Você entende o impacto
que a desigualdade social tem sobre o ser humano, a pobreza, a falta de
instrução
causa doenças.
Depois de 30 anos no Sirio-Libanês eu mudei para o Oswaldo Cruz.
Achar
que eu vou ter novas salas, três enfermeiras a mais, é brutalizar o que
passou pela minha cabeça. Mudei porque não estava vendo esse lugar como
um templo. Eu vivo intensamente, por isso tenho esses sentimentos.
UM POUCO DE FILOSOFIA
A melhor forma de se transmitir as virtudes é pelo exemplo, pela coerência.
Certa
vez perguntaram para Sócrates como a virtude poderia ser transmitida -
se pelas palavras ou conquistada pela prática. Ele não soube responder.
Então, Aristóteles, depois de uns anos, respondeu: "A virtude só pode
ser transmitida pela prática e por meio do exemplo". Aqui, eu posso
tentar ser o exemplo. Mudando o cotidiano das pessoas, transformando a
sociedade e construindo um novo
mundo.
CINCO MEDIDAS PREVENTIVAS
Segundo
Miguel Srougi, a prevenção ao câncer de próstata é feita de forma um
pouco precária, porque não existem soluções para impedi-lo.
Na prática, há o licopeno, que é o pigmento que dá cor ao tomate, à melancia e à goiaba vermelha.
"Talvez diminua em 30% a chance, mas esse dado é controvertido, por
causa disso a gente incentiva os homens a comerem muito tomate, só que
deve ser ingerido pós-fervura, ou seja, precisa ser molho de tomate. Não
pode ser seco ou cru."
A vitamina E
também reduz teoricamente os riscos em 30%, 40%. Mas, se for ingerida
em grandes quantidades, produz problemas cardiovasculares. Na verdade,
se o homem quiser se proteger, deve tomar uma cápsula de vitamina E por dia. Acima disso, não é recomendável.
O terceiro elemento é o Selênio,
um mineral que existe na natureza e é importante para manter a
estabilidade das células, impedindo que elas se degenerem, que é
encontrado em grande quantidade na castanha-do-Pará.
"Qualquer homem pode ingerir em cápsulas, mas se ele
comer duas castanhas por dia, recebe uma certa proteção", diz o especialista. Uma quarta medida é comer peixe, três porções por semana - rico em ômega3 e tem uma ação anticancerígena provável. E, uma quinta, tomar sol." O homem que toma muito sol sintetiza na pele vitamina D,
que tem forte ação anticancerígena. É por isso que os homens da
Califórnia desenvolvem muito menos a doença do que os de Boston", afirma
Srougi.
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