Curioso é que geralmente se escreve assim, movido por uma paixão
mal resolvida, uma tisteza escondida, talvez com o fito inconsciente de
aliviar o peso da tragédia interior tornando-a púbilca numa folha de
papel.
Tenho um dileto amigo que não gosta de ler coisas tristes, ou
melhor, pouco lê, dando vazão às atividades físicas, que é o seu forte;
seja uma caminhada numa trilha ecológica montanha acima, um rapel
molhado nas fímbrias de uma cachoeira silvestre ou num vôo
livre sobre as encostas seculares de uma sobrevivente mata
atlântica. No pouco tempo que resta, quando se envolve numa leitura, o
faz priorizando as alegres e divertidas matérias postadas na internet.
Pensando bem, acho que não está errado não, embora possamos
também aprender com os insucessos e vicissitudes alheias, nada como um
texto otimista pra nos colocar pra cima e em paz com a vida.
Vou portanto brindá-lo desta vez com algo alegre, bem leve, sem a necessidade sequer de um Houaiss como assistente.
Veja bem, Ycaro, meu amigo, como a vida pode ser bela.
Nascemos nús, e naturalmente nada possuímos, a não ser o cuidado
materno do qual dependemos integralmente pra sobreviver durante algum
tempo. E assim crescemos, desapercebidamente.
De minha parte já estou num lucro danado, pois hoje me apresento
bem vestido em reuniões,empresas, investimentos, passando com prazer de
uma a outra atividade ao longo do dia, numa clara evolução do patrimônio
pessoal, com dinheiro suficiente pra curtir tranquilamente sem me
preocupar com o futuro incerto que assalta a maioria dos mortais. Assim
vou seguindo adiante, pretendendo viver muito ainda, privilegiando
sempre a saúde física e mental em todas as instâncias; estar inteiro até
o último suspiro é a meta primordial, queira Deus no conforto de um lar
junto de uma bela e suave companhia; sem me ocupar com filhos e netos
que ficam, cultos, educados, independentes de mim, senhores da própria
sorte.
A vida é bela e a felicidade existe pra mim desde o abrir dos
olhos pela manhã, dirigindo os negócios como o faço com meu próprio
carro ( zero a cada ano ), totalmente despreocupado seja com uma
eventual troca de moeda no sistema financeiro, seja com uma pane do
veículo numa rodovia de intenso movimento. Sempre conto com a lei da
probabilidade a meu favor.
E mesmo no rigor do inverno quero acreditar que os ventos
nórdicos jamais fustigarão o meu rosto, acostumado no mais das vezes com
as carícias da brisa morna que vem do mar ao fim da tarde, tendo uma
caipivódca nas mãos, curtindo minha predileta praia particular a poucos
metros da casa com varanda, solidamente construída em balanço sobre as
escarpas do rochedo; o iate ancorado logo ali no pier dourado pelo por
do Sol, jogando leve ao sabor das pequenas vagas, num plácido espetáculo
da natureza.
Nascido no litoral, num centro industrial, econômico, cultural e
artístico, tudo isso reunido estrategicamente num só lugar, não tenho
do que me queixar; soube aproveitar as oportunidades de crescimento, e
assim me estruturar para ser um quase cidadão do mundo, falando o
essencial em outros idiomas, viajando por outras terras, espalhadas pelo
velho e novo continente, conhecendo-lhes as culturas e mazelas, desta
forma valorizando mais e mais o meu país em cada regresso; livre das
guerras, dos terrorismos e extremistas radicais, o povo aqui convivendo
harmônicamente com as diversas crenças e dogmas, num interessante e
invejável sincretismo religioso.
Mesmo com a praga maior, que é a corrupção que grassa por todos
os setores da sociedade, nativa como uma febre terçã ( que maltrata,
maltrata mas não mata ), mesmo com ela dá pra conviver, pagando-se uma
taxa aqui, um flanelinha ali, um imposto de renda acolá, ainda sobra o
bastante pra sorrir entre doses de um bom uisque, um vinho de uma boa
safra, até mesmo uma seleta cachaça de barril, sorrindo de uma gostosa
piada de cunho político ou não, entre os amigos nos fins de semana, nos
sítios, teatros e boates.
Por que reclamar, meu Deus, se até os amores são generosos e não
nos faltam, se os podemos trocar quatro, cinco vezes, e quando a paixão
acabar, flertar uma vez mais sem compromisso, e namorar, namorar até
platônicamente se fôr o caso.
É, meu caro Ycaro, voce está certo com seu jeito "Pollyanna" de
ser, vendo sempre o lado positivo das coisas. Pra que ler coisas tristes
?
Bom mesmo é assistir a um belo musical na Broadway, um show de
variedades, uma comédia hilariante numa aplaudida turnê que passa pela
cidade, deixando o fígado completamente desopilado mesmo a despeito do
champagne com caviar consumido um tanto em excesso no happy hour de
poucas horas atrás. Basta de manchetes estampadas nas primeiras páginas
de jornais, das chamadas de alguns noticiários televisivos, que
desavisados, não conseguimos evitar a tempo.
Vamos dar boas novas, conversar sobre coisas inteligentes, que agreguem valor...
Alguns dirão que tenho sorte, que nasci bem. Mas saibam que
estudei bastante na juventude, arrisquei muito e trabalhei duro outro
tanto, mas sobretudo fiz as escolhas certas.
No futebol por exemplo, sempre optei pelo melhor time de cada
estado, no Rio, Minas , em São Paulo, por esse Brasil do penta, e pelo
Barça lá fora, como não poderia deixar de ser na atualidade.
Sempre torço pelo melhor, pra que sofrer ? Feliz entre iguais !
Como diz Armando Aguirre, jornalista mexicano, " Eu tenho irmãos
que são como meus amigos, e amigos que são como meus irmãos. "
Além disso, por uma questão de filosofia, jamais faço inimigos,
nunca entro em discussões vazias, convivendo bem com todo tipo de gente,
de qualquer nível. Nuns meios sou "gente fina', noutros "sangue bom"; o
que poderia dar errado pra mim agindo desse jeito ?
Alguns me classificariam como um bon-vivant. Se já nasci assim, só estou me aperfeiçoando com o tempo, eu diria.
Por isso, meu jovem Ycaro, te saúdo e aplaudo. Vivamos muito e
bem até o final do nosso tempo, e o melhor de tudo, celebrando sempre a
vida nas menores coisas. Somos energia pura, desde o menor átomo que nos
compõe.
Parabéns !
Nilson
Ribeiro, poeta ao acaso desde menino, fluminense de 57 anos, dos quais
42 de labuta, lidando com gente de todo quilate, fiz disso inspiração
diária pra aguentar os trancos da vida.
Um comentário:
Nilson:
Amei seu texto.
E confesso que também gosto mais de ver o lado rosa da vida.
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